segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Os filmes que estão rolando em Jampa


VICK CRISTINA BARCELONA


Escrito por Allen como de hábito, o longa gira em torno das duas amigas do título que, durante as férias, decidem passar três meses em Barcelona: Vicky é uma acadêmica cujo mestrado aborda a cultura catalã e que está noiva de um executivo de Nova York, ao passo que Cristina é uma jovem instável que ainda não descobriu sua verdadeira vocação ou mesmo o que busca no amor. Hospedadas na casa de uma parenta de Vicky, elas conhecem o pintor Juan Antonio (Bardem), cujo casamento com a também pintora Maria Elena (Cruz) chegou ao fim quando esta o esfaqueou. Logo as duas moças se vêem atraídas pelo espanhol, embora Vicky, como uma autêntica alter-ego do diretor, resista ao impulso de se entregar em função de todas as suas objeções neuróticas. O triângulo amoroso se complica, porém, ao tornar-se um quadrado com o retorno de Maria Elena.

Banhado em cores quentes que retratam Barcelona como uma cidade de prazeres e sensações intensas, o filme faz uma belíssima utilização dos pontos turísticos do lugar: evitando transformar o longa num mero cartão postal, Woody Allen emprega a arquitetura de Gaudí como um comentário sobre os próprios personagens, que, refletindo o estilo que marcou a obra do catalão, são criaturas tão complexas e aparentemente tão instáveis que mal compreendemos como podem se manter funcionais. Da mesma forma, as músicas que atravessam a narrativa – e que pontuam o único aspecto passional do temperamento de Vicky – não só comentam como também compõem aquele universo repleto de paixões e personalidades tempestuosas.

Enquanto isso, Allen transforma seu pares de personagem em comentários à parte sobre vários temas: se Doug (Messina) e Vicky representam a razão, Juan e Maria Elena são a pura emoção, ao passo que Cristina, plantada ali no meio, tenta encontrar um equilíbrio ao analisar constantemente os próprios sentimentos (o que, de certa forma, a impede de sentir-se completamente feliz ou em paz com suas escolhas, que passam por um permanente auto-questionamento). Por outro lado, se o casal norte-americano reflete o puritanismo (Vicky) e o materialismo (Doug) ianque, Juan e Maria Elena defendem, através de suas atitudes, a liberalidade e a sofisticação intelectual e artística do velho continente – permanecendo Cristina novamente entre os dois, já que, apesar de mais aberta a experimentações sexuais e de relacionamento, permite que sua natureza inconstante a leve de volta ao individualismo representado por sua “busca” solitária por um romance ideal.

O TRAIDOR


Com uma história original criada pelo ator e diretor Steve Martin, o suspense "O traidor", estréia na direção de Jeffrey Nachmanoff, reserva algumas surpresas. A maior delas, criar um protagonista bem mais ambíguo do que a média, Samir Horn (Don Cheadle, indicado para o Oscar por "Hotel Rwanda").
O maior desafio deste suspense, que entra em circuito nacional na sexta-feira (14), é procurar saber exatamente o que se passa na cabeça deste homem misterioso. Nascido no Sudão, ainda criança Samir viu seu pai morrer num atentado a bomba.
Muçulmano devoto, depois de viver vários anos nos Estados Unidos, tornou-se oficial de operações especiais. Aparentemente, passou para o lado dos militantes ultra-radicais muçulmanos, transformando-se num criminoso caçado pelo FBI.
Preso quando tentava vender armas a extremistas no Iêmen, Samir tem um rápido encontro com aquele que, de agora em diante, tentará decifrá-lo, o agente do FBI Roy Clayton (Guy Pearce, de "Atos que desafiam a morte").
Contrário aos métodos violentos do colega Archer (Neal McDonough), Clayton percebe que Horn domina informações importantes e gostaria de ganhá-lo para o seu lado. Quando isto falha, vai sobrar perigo, inclusive para os EUA.
Na prisão, Horn aproximou-se de Omar (o francês Said Taghmanaoui, de "O caçador de pipas"), líder de um grupo radical islâmico. Ganhando a custo sua confiança, Horn torna-se peça fundamental dentro dos planos de diversos atentados, usando homens-bomba, inclusive nos EUA.
O comportamento de Horn, porém, deixa margem a algumas dúvidas. Não se consegue perceber muito bem o tipo de ligação que mantém com Carter (Jeff Daniels, de "A Lula e a Baleia"), um veterano da CIA que não gosta de compartilhar informações com o FBI Clayton.
A maior novidade de "O traidor" é aproximar-se do ponto de vista de terroristas com bastante realismo. Com isso, consegue ser mais fiel à complicada situação política internacional do que a maioria dos filmes do mesmo gênero.

QUANTUM OF SOLACE


No mais seco e passional James Bond já filmado, QUANTUM OF SOLACE é um ofegante mergulho na ação desenfreada que urge nas variadas seqüências de pancadaria, tiros, golpes a faca, perseguição em carros, aviões e barcos.
Em tradução aproximada, o título significa “mínimo de consolo” e aqui é expresso diretamente na forma como o agente britânico exerce sua licença para matar, vingando a morte de Vesper (Eva Green), a Bond girl de CASSINO ROYALE por quem se apaixonara e por quem foi traído. O resultado é uma história mais focada em espionagem do que “love affairs”. Há pouco romance (embora haja algumas cenas) e a Bond girl Olga Kurylenko passa quase despercebida na fita.
QUANTUM OF SOLACE se passa 40 minutos depois de CASSINO ROYALE e em 6 locações diferentes. É a primeira seqüência da história do espião no cinema (Os outros 21 filmes têm roteiros independentes) e é adrenalina pura. Parte do mérito se deve à competente direção de Marc Foster que divide o crédito com a equipe técnica supervisionada por Dan Bradley e Gary Powell, veteranos da trilogia BOURNE e responsáveis pelas emocionantes cenas que deixam qualquer credibilidade na poeira.
O filme esbanja um certo domínio técnico, um acabamento impecável, envernizado, polido, lapidado. A edição da cena da “Tosca” por exemplo, sincronizando a ópera à música clássica e às perseguições e tiroteios é um toque de mestre. É o triunfo do cinema de arte embalado em fita comercial.
Craig repete uma interpretação marcante que sugere uma certa invencibilidade. Nada o impede ou o detém. Suas ações são meticulosas e precisas. Judi Dench tem boas cenas e Mathieu Amalric, graças aO ESCAFANDRO E A BORBOLETA interpreta a loucura do seu vilão sempre através do olhar penetrante.
QUANTUM OF SOLACE é um filme eficiente no que se propõe: Uma história bem contada sempre no volume máximo e com elenco afiado. Há somente um perigo nessa versão do herói de Ian Fleming. Um assassino tem sempre algo a resgatar nos filmes. Bourne tinha a presunção da inocência e o Bond de Sean Connery tinha uma sagacidade irônica. Já o Bond seco de Craig, está impassível diante de qualquer sentimento. Tornou-se uma máquina de matar, um mero soldado da rainha.